sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

Anomalias

 O choro, aquele sentido, já não existe mais. Talvez por falta de sofrimento; talvez pela experiência de tantos sofrimentos passados. A vida, agora cinza e insossa, também passa breve pelos olhos fartos e com grandes bolsas de insônia. O café passado nunca foi tão presente. Em risos breves, monotonias infinitas e conversas sem profundidade alguma, mais um ciclo se encerra para que outro possa ter início. Começar nunca foi o problema, tampouco, acabar. O real problema sempre foi se manter. Permanecer, se assim você preferir. Tantas pessoas ao redor com suas conquistas importantíssimas, tanto zelo em suas preparações e afinco em suas ambições, enquanto eu, esta minúscula parcela da sociedade acinzentada, observo com minha sobrancelha elevada e meio sorriso debochado.

Eu não consigo entender como vocês não entendem. Eu não era assim. Eu era como vocês. Eu já fui um de vocês. O que aconteceu comigo?

Amarguras já não são amargas, praticamente não tem gosto. Um cigarro aceso, a mais ou a menos, já tanto faz. Garçom, um copo de amor, por favor. O de sempre.

De segunda a segunda, ou, se preferir, de segunda a domingo, permanecemos abertos e pensativos. Aqui não é o típico lugar onde você irá encontrar companhia, apesar de sempre cheio. Não, aqui as mesas não são divididas e as comandas são individualizadas. No alto, uma placa que diz "|AQUI O SEU PROBLEMA NÃO É NOSSO - A GERENCIA|". Heh, um riso bobo. Aqui servimos a pior coisa do mundo: Solidão, acompanhada de pensamentos infinitos. Também temos tristeza infundada, mas essa já é prata da casa, é o nosso couvert e você irá consumir mesmo se não pagar. E, ah, você vai pagar por isso.

Saindo dali, será que realmente estive lá? Ou será que, aquele lugar, agora, permanece em mim? Difícil dizer. Existe poesia na tristeza que só um coração que já foi quebrado é capaz de enxergar. Meus pedaços, mesmo quando colados forçadamente, não me fazem inteiro. Eu nunca mais serei quem eu era e jamais chegarei perto de ser o que eu gostaria de ter sido. A vida já passou, e eu perdi o bonde. A minha janela de oportunidades foi trancada por mim mesmo, e as chaves, arremessadas de olhos fechados para não saber onde caíram.

Apelando licença poética, irei parafrasear o autor com um toque pessoal: É o fim do mundo todo dia ao pé da cama.


Feliz 2021.